"Descobri que servia era pra aquilo: Ter orgasmo com as palavras."
A frase, escrita por Manoel de Barros, poeta nascido em 19 de dezembro de 1916, em Cuiabá (Mato Grosso), é a perfeita definição do que ele fazia com os vocábulos: os transformava em um ato de prazer para que cada frase pudesse virar e se revirar na liberdade de significar outra.
Conhecido como o poeta pantaneiro, a natureza foi a principal inspiração do escritor, mestre em transformar as singelezas em portais mágicos para o imaginário. Graças à escrita inovadora, recebeu vários prêmios literários, entre eles, dois Prêmios Jabutis por "O Guardador de Águas" (1989) e "O Fazedor do Amanhecer" (2002).
“Eu trato muito dessas coisas miudinhas. Nós desprezamos o ínfimo. O homem despreza o que é pequeno, é desimportante, não vale nada, é lixo. Mas para a poesia, vale”, disse Barros certa vez.
Faleceu no dia 14 de novembro de 2014, aos 98 anos, em Campo Grande (Mato Grosso do Sul), e deixou 18 livros, além de obras infantis e relatos autobiográficos, que enriquecem a literatura brasileira e mostram como a escrita livre é um convite à criatividade.
Alguns deles, estão compartilhados abaixo.
Confira os poemas de Manoel de Barros:
Formiga é um ser tão pequeno que não aguenta nem neblina. Bernardo me ensinou: Para infantilizar formigas é só pingar um pouquinho de água no coração delas. Achei fácil.
Quem ama exerce Deus — a mãe disse. Uma açucena me ama. Uma açucena exerce Deus?
Eu queria crescer pra passarinho...
Extraído do Livro Sobre Nada (Arte de Infantilizar Formigas)
"Naquele dia, no meio do jantar, eu contei que
tentara pegar na bunda do vento — mas o rabo
do vento escorregava muito e eu não consegui
pegar. Eu teria sete anos. A mãe fez um sorriso
carinhoso para mim e não disse nada. Meus irmãos
deram gaitadas me gozando. O pai ficou preocupado
e disse que eu tivera um vareio da imaginação(...)"
Texto extraído do livro Memórias Inventadas - A Terceira Infância
"Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim um atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso(...)"
Do poema "O apanhador de desperdícios"
"A maior riqueza
do homem
é sua incompletude.
Nesse ponto
sou abastado(...)"
Do poema "Retrato do artista quando coisa"
"Em toda a minha vida só engenhei
3 máquinas
Como sejam:
Uma pequena manivela para pegar no sono.
Um fazedor de amanhecer
para usamentos de poetas
E um platinado de mandioca para o
fordeco de meu irmão(...)"
O poema "O fazedor de amanhecer"
"O filósofo Kierkegaard me ensinou que cultura
é o caminho que o homem percorre para se conhecer.
Sócrates fez o seu caminho de cultura e ao fim
falou que só sabia que não sabia de nada(...)"
Do poema "Aprendimentos"
Imagens: Pixabay
Copyright © 2019 I Cris Mendonça. Manoel de Barros e suas palavras recriadas. Todos os direitos reservados.