mulheres que escrevem

Escrever é verbo e também se conjuga no feminino 

Sobre o encontro de mulheres escritoras em BH e outras cidades
Foto: Encontro de escritoras mineiras em BH - Imagem: Liliane Pelegrini / Bendita Conteúdo & Imagem

Domingo, Dia dos Namorados e um convite matinal para comparecer à Praça da Liberdade para tirar uma foto com outras escritoras mineiras de Belo Horizonte. Minha primeira reação foi “Que legal!”, mas logo veio a dúvida: “Será que vai alguém?”. Ledo engano. Às 10h35 desci do Uber e logo avistei dezenas de mulheres em frente ao prédio histórico do Centro Cultural do Banco do Brasil. Cheguei, fiquei no cantinho da escadaria num misto de surpresa e timidez ao ver tantas mulheres segurando seus livros, tagarelas e felizes. Um calorzinho subiu pelo meu rosto e sorri satisfeita de ver tantas escritoras anônimas, assim como eu.

Ainda encantada pela maré de mulheres que escrevem à minha frente, despertei, interrompida pela voz de uma senhora:
_Era para trazer o livro? Esqueci!

Fiquei na dúvida se ela era uma escritora ou apreciadora do movimento. Seus cabelos claros, cortados acima dos ombros, seus óculos de grau e um colar curto lhe davam um ar de professora primária, que me confundiram. Respondi que sim, eles haviam sugerido. O marido dela, que estava ao lado, respondeu sem vacilar:

_Volto em casa e busco. Qual você quer?
_A coleção da bruxinha.

E foi assim que percebi que estava diante de uma escritora infanto-juvenil, autora de dezenas de obras, que ela foi me mostrando pelo celular. As capas coloridas e os títulos divertidos e inocentes, foram sussurrando no meu ouvido o encantamento que os livros me causavam na infância e como eu era curiosa a respeito de todas as histórias que habitavam aquelas páginas. Quem escreveu? Quem desenhou? Como seria a autora? De onde saiu aquela personagem? Então, eu estava diante de uma autora infantil, talvez muito parecida com todas que desejei conhecer ainda menina. Graças a pessoas como ela, eu me descobri em uma biblioteca de escola pública. Primeiro, por amar os livros; anos depois, por amar a escrita.
 
Esse domingo de encontro de mulheres escritoras, algumas em Belo Horizonte; e outras que se encontraram Brasil afora, é sobre a beleza de contar histórias e como elas transformam as vidas das pessoas. Modificam nosso pensamento, nos despertam para o desconhecido, nos encantam pela magia do improvável, assim como nos contam sobre as dores e as verdades do mundo.

A moça que escreve sobre a imposição da maternidade; a psicóloga que escreve sobre a saúde mental de mulheres negras; a menina de cabelos cacheados com seu livro de ficção; as mulheres de óculos coloridos e suas poesias; as meninas de 20 e poucos; as senhoras de 60 e tantos; e as escritoras que não são mais anônimas se misturando à maré de mulheres e palavras: faladas, escritas e sentidas. Todas reunidas na escadaria de um prédio centenário.

Foi assim em Belo Horizonte, onde escrevi “Mineiros não dizem eu te amo” para dizer que afeto também é gesto; em Roraima, onde uma escritora foi com seu cocar; em São Paulo, onde a fila de autoras fez volta no entorno do Pacaembu;  em Fortaleza; em Londrina; no Rio e outras cidades mais.

Não sonhei em ser escritora na infância. Eu morava no interior e era raríssimo conhecer alguém que publicasse livros. Porém, esse sonho era semente em mim e a vida se encarregou de germinar. Ao mesmo tempo que vi filmes e li reportagens sobre a história de mulheres que escreviam, mas não assinavam suas obras, porque em diferentes lugares do mundo, a sociedade não dava voz a elas. Ainda assim, sempre fomos muitas e continuamos a ser.

Pela memória de Virginia Woolf,  Mary Shelley, Cecília Meireles, Carolina de Jesus, Lya Luft, Cora Coralina e milhares de outras. Em tributo a Conceição Evaristo Costa, Marta Medeiros, Cris Pàz, Leila Ferreira, Adélia Prado, Aline Bei e todas aquelas que estão escrevendo agora, anonimamente, por amor à escrita.

Escrever é potente. Escrever é verbo e também se conjuga no feminino. 

Parabéns às organizadoras do encontro: Cristiana Rodrigues, Giovana Madalosso, Paula Carvalho e Natália Timerman!

Copyright © 2022 I Cris Mendonça. Escrever é verbo e também se conjuga no feminino. Todos os direitos reservados.

 

 

 


Comentários
CRISTINA REIS DE SOUSA
Parabéns por suas palavras! Foi assim mesmo como você escreveu: uma mistura de fala e emoção por estar naquele momento histórico! Abraços!
Vanessa Marques
Lindo texto! Me trouxe o mesmo calor que senti ontem, no coração. A sua descrição de como chegou e o que sentiu, combina exatamente com o que experimentei nesse encontro! Obrigada pela escrita e Obrigada á todas as organizadoras!
Maria de Lourdes Oliveira
Que delícia de encontro👏👏👏
Francirene Gripp de Oliveira
Lindo depoimento, notícia bem vivenciada!
Hanna Meirelles
Parabéns pela matéria, Cris! Fiquei muito emocionado por fazer parte deste momento histórico, no início dos meus 40, escrevendo histórias reais transformadas em romances em um outro idioma… me senti parte! Parte desta comunidade incrível de escritoras poderosas e talentosas que abraçam seu propósito e daí voz a diversidade existente! Quanta potência! ❤️
Helena Soares Aphonso
Parabéns pelo texto, foi bem assim. Amei. Participar, encontrar, abraçar, trocar expectativas com elas foi encorajador, somos muitas e estamos com determinação. Somos juntas. Viva nós mulheres escritoras. Gratidão.
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